"Os apuros do ‘Pelé’ do PT", editorial do Estadão


O ESTADO DE S. PAULO

No momento em que muita gente no PT esperava salvar o time colocando em campo o ex-presidente Lula, eis que o líder petista se vê formalmente envolvido no escândalo do petrolão.

Segundo um documento da Polícia Federal (PF) enviado ao Supremo Tribunal Federal e obtido pela revista Época, Lula, “na condição de mandatário máximo do País, pode ter se beneficiado do esquema em curso na Petrobrás, obtendo vantagens para si, para seu partido, o PT, ou mesmo para seu governo, com a manutenção de uma base de apoio partidário sustentada à custa de negócios ilícitos na referida estatal”. A PF pretende ouvir Lula no inquérito, pois “os fatos evidenciam que o esquema que ora se apura é, antes de tudo, um esquema de poder político alimentado com vultosos recursos da maior empresa do Brasil”.

Craque em driblar suspeitas de ligação com os escândalos que atingiram vários de seus colaboradores mais próximos, como José Dirceu e Antonio Palocci, Lula parecia inatingível. Sempre foi tido no PT como aquele a quem os adversários mais temiam – e depois que Dilma Rousseff foi eleita presidente, em 2010, seu nome passou a ser invocado como uma espécie de advertência mística, quase religiosa, para que ninguém ousasse desafiar o partido.

Em janeiro de 2011, nem bem Dilma havia começado seu mandato, o então secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, já alardeava que o time do PT podia se dar ao luxo de “ter o Pelé no banco de reservas” – referência, naturalmente, a Lula. “É evidente que, se (o governo Dilma) não der certo, temos um curinga. Estou dizendo para a oposição: calma. Não se agitem demais. Temos uma carga pesada. Não brinca muito que a gente traz. É ter o Pelé no banco de reservas.”

Era um aviso claro de que, se o time estivesse enfrentando “uma dificuldade na gestão, na economia, algum acidente, por exemplo, na economia do mundo”, como aventou Carvalho, premonitório, o “craque” Lula poderia voltar a qualquer momento, pois ninguém é bobo de manter seu “Pelé” no banco, havendo necessidade dele em campo. Dito e feito. Como Dilma só se reelegeu porque distribuiu pontapés nos adversários, e no segundo mandato só consegue matar a bola de canela, levando goleadas na economia e na política, os petistas trataram finalmente de colocar o seu “Pelé” no aquecimento – pois, segundo imaginavam, só ele seria capaz de virar um jogo que, a esta altura, parece perdido para o partido.

O problema, para os esperançosos petistas, é que o “craque” Lula já não é mais aquele que assumiu a Presidência em 2003, considerado pelo ex-metalúrgico como o “ano zero” da história do Brasil. Passados mais de dez anos, Lula não inspira a mesma confiança na torcida – as mais recentes pesquisas de opinião indicam uma franca decadência de sua imagem perante o eleitorado, mesmo em redutos nos quais ele parecia intocável.

É claro que Lula continua muito bom em criar mistificações, uma característica que o favorece no ambiente de campanha eleitoral permanente que o PT criou no País desde que chegou ao poder. Só um mestre das imposturas, por exemplo, seria capaz de garantir que a atual crise não pode ser superada com austeridade, mas sim com a ampliação dos gastos públicos – como se o País ainda vivesse aquele momento mágico de sua administração em que a desenfreada gastança lulopetista podia ser sustentada por receitas crescentes.

Ao agir desse modo, Lula sabota deliberadamente os esforços do governo Dilma para contornar a crise. Em sua visão, e na dos petistas que o apoiam, não se trata de um gol contra, pois afinal o que interessa é resgatar a aura do PT, perdida em algum lugar entre o mensalão, o petrolão e o desastre econômico, mesmo que para isso seja necessário jogar Dilma para escanteio.

Mas a queda de popularidade não é mais o único problema do “Pelé” do PT. Agora, ao ver seu nome envolvido diretamente no maior escândalo de corrupção da história brasileira, é possível que não lhe reste alternativa senão, discretamente, pendurar as chuteiras – isso se, antes, não acabar levando cartão vermelho da Justiça.

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