"A minha vida se dividiu entre antes e depois da morte do meu filho", diz Geraldo Alckmin


IstoÉ

O governador de São Paulo conta como está enfrentando a perda trágica do filho Thomaz, diz que não deve haver rodízio de água no Estado e afirma que a presidente Dilma passa por momento de grande fragilidadepor Gisele Vitória, de Nova York

DESABAFO 
"Conversando, trabalhando ou viajando, sinto dor 24 horas"

Eram 7h da quarta-feira 13, em Nova York e, sentado no lobby do hotel Sofitel, na 44ª St., o governador Geraldo Alckmin debruçava-se sobre as últimas lâminas do powerpoint que apresentaria no Harvard Club. Dona Lu Alckmin chegaria em minutos, de vestido branco sem mangas, mas, com frio, voltou ao quarto para buscar um trench coat. A palestra para atrair investimentos para São Paulo aconteceria a 20 metros do hotel, no seminário Lide Business Meeting. No evento, após a detalhada exposição de Alckmin, houve um momento de comoção. A lembrança do luto do governador pela morte do filho Thomaz na queda de um helicóptero, há menos de dois meses, motivou aplausos de pé. Quando 370 empresários se levantaram para bater palmas, Alckmin se emocionou e agradeceu.

Na platéia, a primeira-dama chorou. À IstoÉ, Dona Lu disse: “Sempre achei que se perdesse um filho, eu morreria. E Thomaz era o filho mais agarrado. Mas descobri que sou mais forte. Converso com ele. Sinto que ele está sempre comigo. Só não posso falar muito que choro.”Ela lembrou que as investigações do acidente ainda não terminaram. “Mas isso não vai trazê-lo de volta”, diz. A gente tem que ser forte e continuar.” No café da manhã no hotel em Manhatan, o governador falou com exclusividade à IstoÉ.


ISTOÉ - Como o senhor está enfrentando a perda do seu filho caçula, Thomaz?

GERALDO ALCKMIN - A minha vida se dividiu entre antes e depois do dia 2 de abril. Entre antes e depois da morte de meu filho. Sinto dor 24 horas. É uma dor sem fim. Uma dor que não passa. Estamos aqui conversando, viajando, trabalhando, estou 24 horas sentindo dor. Mas é impressionante como eu tenho lido bastante sobre a vida após a morte. 

ISTOÉ - Que tipo de livros? Allan Kardec?

GERALDO ALCKMIN - Tenho lido muito. Vários livros. Alguns judaicos, espíritas, evangélicos. Mas, especialmente católicos, pelo fato de eu ser católico. Eu vim lendo nesta viagem do Brasil para Washington, a última encíclica do papa Bento 16. “Fé e esperança”. E ele disse que a única explicação para a razão humana é o amor incondicionado. Não é aquele do qual você espera alguma coisa em troca. É amor incondicional. Tenho lido muito também textos de Santo Agostinho. Bispo que viveu 300 anos depois de Cristo, nasceu na Argélia. Ele é chamado o santo do amor. Ele disse: “Quem ama faz o bem”. Também escreveu: “Eu acredito piamente na existência do inferno e acredito ainda mais piamente que não tem ninguém no inferno”. O que estou fazendo é tentando fortalecer a fé e ter o conforto no carinho dos amigos, das pessoas queridas. São impressionantes as manifestações que recebemos do País inteiro.

ISTOÉ -Alguma mensagem em especial o confortou?

GERALDO ALCKMIN - Eu vim agora no avião pela United Airlines e toda a tripulação era americana. Quando o avião pousou em Washington, o comissário foi lá no meu assento e me disse: “O comandante pediu para eu lhe dar este bilhete.” Era uma cartinha, assinada pelo piloto e pelo co-piloto do avião. Um cartãozinho deles em solidariedade ao colega, piloto, Thomaz, com todo carinho a nós. Nossa, a Lu ficou com o coração confortado. 

ISTOÉ - Esse vôo para Washington foi na noite do Dia das Mães. Como passaram a data durante o dia?

GERALDO ALCKMIN - Nós fomos à missa. Vamos normalmente na Igreja de Santo Antonio. Almoçamos em família. Thomaz nos deixou duas netinhas. Uma de 11 anos, que está fora, e uma de 30 dias. A Isabela e a Julia. Força, né? 

ISTOÉ - Os pais costumam dizer que preferem morrer no lugar dos filhos.

GERALDO ALCKMIN - É óbvio que eu preferia. Esta é a inversão da ordem natural das coisas. É a maior dor que existe. Porque o natural é que os filhos enterrem os pais. Pai enterrar filho é uma dor sem fim. Mas vamos ter fé. (Alckmin se emociona e interrompe o assunto).

ISTOÉ - Como o senhor avalia o papel da presidente Dilma Rousseff neste momento de crise tão profunda no Brasil?

GERALDO ALCKMIN - Vivemos uma crise ética, uma crise econômica. É grave. Eu acho que a economia está esfriando de forma muito preocupante. E tem a crise política. A democracia brasileira é forte, mas é muito cheia de defeitos. Se não fizermos uma reforma política rápida, vai ser difícil. Como é que pode? Nós estamos com 31 partidos, e 26 na lista de espera. Já imaginou? Devemos chegar a 60 partidos políticos. Isso é inimaginável. Ela está num momento de grande fragilização. Extremamente fragilizada. Tenho respeito por ela, mas o momento dela é dificílimo. São múltiplas as crises.

ISTOÉ - Como sair disso?

GERALDO ALCKMIN - A disposição de São Paulo é ajudar, trabalhando. Por isso viemos aqui aos Estados Unidos, trazer uma mensagem de confiança, esperança, trabalho e oportunidade. Ajuste fiscal não gera emprego. O que gera emprego é investimento, confiança. É preciso estar atento à questão do credito e do investimento, se não nós vamos ter uma recessão maior do que se imagina.

ISTOÉ - O senhor está entre os mais moderados do PSDB.

GERALDO ALCKMIN - O PSDB não tem ala moderada. É um só: oposição. É tão patriótico ser governo quanto ser oposição. Agora, nós temos que trabalhar. Nós somos governantes. São Paulo indo bem ajuda o Brasil. Essa é nossa tarefa, exercer uma fiscalização importante através da oposição e temos de trabalhar. Num País que é federativo são muitas parcerias em benefício para a população.

ISTOÉ - Como foi essa sua passagem por Washington? 

GERALDO ALCKMIN - Foram duas agendas positivas. No Banco Mundial (Bird), obtivemos R$ 156 milhões para obras de recursos hídricos, tanto as estruturantes quanto as emergenciais. Uma delas, estruturante, integrará bacias diferentes e deve ficar pronta até setembro, trazendo quatro metros cúbicos por segundo. Atenderá 1,2 milhão de pessoas com água nova. A outra obra é um modelo do que há de mais moderno no mundo. São chamadas de membranas ultrafiltrantes. Você filtra por pressão negativa, e limpa a água por essas membranas. É uma tecnologia de ponta. Os equipamentos são da Alemanha e estão chegando em São Paulo para funcionar em 60 dias. Com isso, nós poderemos tratar toda a água do Sistema Guarapiranga. O Cantareira, que era o maior sistema de São Paulo, hoje é o segundo. O primeiro é Guarapiranga, só que a estação de tratamento de água está no limite. Tudo isso vai ser financiado pelo banco mundial. Há outra obra estruturante, que é a interligação das bacias do Rio Paraíba e do vale do Cantareira.

ISTOÉ - Há críticos a essa obra. Alegam que vai prejudicar o Rio de Janeiro e o próprio Rio Paraíba.

GERALDO ALCKMIN - O Paraíba é um gigante. Tem 200 metros cúbicos de água. Vamos tirar cinco metros cúbicos por segundo. Por que é importante? Quando você integra as duas bacias, passa a haver uma capacidade de guardar 2,1 bilhões de metros cúbicos de água.

ISTOÉ - Isso permite dizer não vai faltar água em São Paulo?

GERALDO ALCKMIN - Estamos trabalhando para não ter o rodízio. Tudo indica que não teremos. Para isso a gente tem de manter o bônus. E há uma boa notícia: 82% reduziram o consumo. É impressionante a adesão da população. Não deixa a torneira aberta quando faz a barba, põe o balde para tomar banho. Nós fomos o único governo do Brasil que deu o bônus. Economize 10% da água que você consome e você ganha 10% de bônus. Economize 15% e você ganha 20% de bônus. Economize 20% você ganha 30%. E, no futuro, quanto tirar o bônus, fica a cultura de evitar o desperdício.

ISTOÉ - E o segundo financiamento?

GERALDO ALCKMIN - O segundo é no BID. O grande problema é como o Brasil pode aquecer a atividade econômica que está numa estagnação impressionante. Um dos caminhos é o investimento em infraestrutura e logística. O que gera muito emprego. Só na linha 5 do Metro em São Paulo há 9 mil pessoas trabalhando. Então, investir em infraestrutura e logística estimula a economia, melhora a produtividade, reduz o custo Brasil. Hoje o problema é o crédito, o problema é dinheiro. Dinheiro que não seja tão caro. No BID nós pedimos apoio não para nos emprestar diretamente, mas como fundo garantidor. Você consegue uma garantia do BID, nós fazemos uma licitação internacional. Por exemplo, você quer me emprestar US$ 500 milhões para pagar em 20 anos. Se você tem uma garantia do BID ou do Bird os juros vão lá para baixo. Acertamos isso com o BID.

ISTOÉ - Onde serão usados esses recursos?

GERALDO ALCKMIN - Estamos estudando cinco áreas de novas concessões. Transporte, rodovias, trem intercidades, habitação na região do centro expandido de São Paulo. Saúde. Não é fazer prédio. Falamos em diagnostico por imagem em 90 hospitais. Você faz uma PPP, e você tem uma empresa que faz a parte de imagem nos 90 hospitais. Reduz o custo e melhora qualidade e a rapidez. 

ISTOÉ - Como convencer os americanos a investir no Brasil?

GERALDO ALCKMIN - O Brasil é um País con­­tinental, líder na America Latina. São Paulo é um dos Estados com maior mercado consumidor, logís­tica, recursos humanos, tecnologia, agronegócio mais competitivo, uma industria muito di­­ver­­si­fi­ca­da, serviços, e passando uma si­tuação momentânea de crise. E investimento se faz olhando mais para frente.

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