"Rio de Janeiro precisa de um político enfadonho como Alckmin", artigo de Leandro Narloch


Folha de S.Paulo


Difícil pensar numa figura menos carioca que Geraldo Alckmin. O governador paulista não tem molejo, não conta piada, não constrói teleféricos no morro. Mas é justamente um picolé de chuchu como Alckmin que o Rio de Janeiro mais precisa neste momento.

Violência e crise fiscal são os dois problemas mais graves que os fluminenses enfrentam. A morte da vereadora Marielle Franco é mais um episódio de uma triste sequência que nos faz perder a esperança com a moralização da polícia, a pacificação das favelas e a queda na taxa de homicídios no Estado.

Mas o Rio sequer tem dinheiro para a gasolina das viaturas da Polícia Militar. Nos anos de bonança, Sérgio Cabral foi o governador que mais aumentou os gastos com pessoal, deixando o Estado vulnerável a quedas de arrecadação.

Hoje o Rio não tem dinheiro para pagar funcionários públicos nem para manter hospitais, delegacias ou universidades. Por falta de verbas, a UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) cortou mais da metade das vagas em 2018.

Pois segurança e política fiscal são as duas áreas (talvez as únicas) em que Alckmin tem algo a mostrar.

Quando vai a reuniões políticas, o governador leva na bolsa um gráfico plastificado. A imagem compara a evolução da taxa de homicídios no Brasil com a de São Paulo. Enquanto no país a taxa oscilou ao redor 30 homicídios por 100 mil habitantes, em São Paulo ela caiu quase quatro vezes de 2001 até o ano passado.

Mesmo se houver alguma maquiagem nessa estatística, é difícil negar que a violência está muito menos grave em São Paulo do que já foi –ou do que no resto do país.

Outro “cartão de visitas” que Alckmin costuma carregar é o das contas públicas. É verdade que a arrecadação não caiu tanto em São Paulo quanto no Rio. Ainda assim, Alckmin conseguiu fazer R$ 1,5 bilhão sobrar no caixa em 2016, quando a arrecadação caiu 7,7%. Como diz este editorial da Folha, “o governo paulista conseguiu controlar despesas e evitar o quadro de interrupção de serviços públicos e de pagamento de salários observado em outros estados”.

Mas não dá para saber se o governador vai conseguir reverter essas qualidades em votos de mineiros, cariocas e nordestinos na eleição presidencial.

Primeiro, porque nenhum eleitor vai escolher um político porque ele sabe manter o equilíbrio das contas públicas. Não só o Rio de Janeiro –o mundo todo costuma preferir os políticos festivos e perdulários. Não fosse assim, os países não teriam hoje 58 trilhões de dólares em dívida pública.

Além disso, a falácia da narrativa deve agir contra Alckmin durante a campanha. Apesar da violência ter diminuído, a impressão das pessoas é outra. Como São Paulo é muito populoso, não faltam casos no noticiário para impressionar a eleitores e fazê-los desconfiar dos números.

O melhor de Alckmin é o que ele não faz. Não gasta mais do que arrecada. Não atrapalha demais. Não tem autoestima necessária a uma tolice desastrosa como as de Dilma Rousseff, nem audácia ou esperteza suficientes para criar um grande esquema de corrupção. Não chega a ser um grande político –mas, se comparado a um Sérgio Cabral...


*Leandro Narloch - Jornalista, mestre em filosofia e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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