Ex-governador do Rio, Sérgio Cabral é preso pela Lava-Jato


Em cooperação inédita, juiz Sérgio Moro também expediu junto a Marcelo Bretas mandado de prisão preventiva contra o ex-governador do Rio

CHICO OTAVIO E DANIEL BIASETTO - O GLOBO

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Agentes da Polícia Federal e da força-tarefa do Ministério Público Federal do Rio cumprem nesta manhã de quinta-feira dois mandados de prisão preventiva contra o ex-governador Sérgio Cabral - já preso - e outras oito pessoas ligadas ao peemedebista, acusado de liderar um grupo que desviou cerca de R$ 224 milhões em contratos com diversas empreiteiras, dos quais R$ 30 milhões referentes a obras tocadas pela Andrade Gutierrez e a Carioca Engenharia.

A ex-primeira-dama Adriana Ancelmo é um dos alvos, porém, ela será levada para depor na sede da PF local em condução coercitiva. Adriana, que deve ser liberada após prestar depoimento, chegou a ter o seu pedido de prisão pelo MPF analisado pela Justiça, mas negado pelo juiz Marcelo Bretas.

Os agentes entraram dentro do apartamento do ex-governador, no Leblon, Zona Sul do Rio. Até o momento dez pessoas foram presas: Cabral, Wagner Jordão Garcia, ex-assessor do ex-governador, o ex-secretário de Governo Wilson Carlos, com dois mandados de prisão também (temporária e preventiva), e outras sete pessoas.

Além de Cabral, que já está na sede da PF, são alvos da operação o ex-secretário estadual de Obras Hudson Braga, e o ex-assessor do governador Carlos Emanuel de Carvalho Miranda, o Carlinhos, ex-marido de uma prima de Cabral.

Outros operadores são alvos da ação: José Orlando Rabelo e Luiz Paulo Reis.

No total, há 34 mandados de busca e apreensão em três cidades além do Rio - Mangaratiba, Paraíba do Sul e Itaipava, e outros 14 de condução coercitiva.

Todos os alvos de prisão preventiva deverão ser levados para a Superintendência da PF no Rio, e após prestarem depoimento, serão encaminhados ao Instituto Médico Legal (IML) para realizar exames de corpo de delito.


TUMULTO E PROTESTO

O grupo de intervenção tática da PF disparou gás de pimenta quando os carros da polícia deixaram o apartamento de Cabral. Houve tumulto e protesto de populares que gritavam "Lincha", "Lincha", "Lincha".

Repórteres foram atingidos pelo gás, entre eles, o da TV GLOBO Paulo Renato Soares, que ficou com sérias dificuldades para enxergar.


OPERAÇÃO CALICUTE

'OXIGÊNIO' , O NOVO PIXULECO

Autorizada pelos juízes Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, e Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, a operação batizada de "Calicute" - referência às tormentas enfrentadas pelo navegador Pedro Álvares Cabral a caminho das Índias - acontece pouco mais de cinco meses depois da estreia da Lava-Jato no Rio e é resultado de uma esforço conjunto do MPF e seus procuradores Lauro Coelho, Eduardo El Hage, Rodrigo Timóteo e José Augusto Vagos, com a Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros da Polícia Federal (Delecor). A ação marca também a inédita cooperação entre a Justiça do Rio e a de Curitiba, responsável pelas 36 fases deflagradas até aqui.

Cabral, o ex-governador, é acusado pela Lava-Jato dos crimes de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Os desvios teriam sido feitos em contratos com as empreiteiras Andrade Gutierrez, Carioca Engenharia, entre outras, em obras como reforma do Maracanã, o Arco Metropoliltano e PAC Favelas em troca de aditivos em contratos públicos.

A investigação teve como ponto de partida as delações de Clóvis Primo e Rogério Numa, executivos da Andrade Gutierrez, feitas no âmbito do inquérito do caso Eletronuclear. Os dois revelaram à força-tarefa que os executivos das empreiteiras se reuniram no Palácio Guanabara, sede do governo, para tratar da propina e que houve cobrança nos contratos de grandes obras.

Se a operação Lava-Jato de Curitiba descobriu o "pixuleco", termo usado pelo ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto ao se referir à propina cobrada de empreiteiras, o dinheiro de corrupção no governo Cabral também tinha um vocábulo próprio: "oxigênio". Era assim que o ex-secretário estadual de Obras Hudson Braga (novembro de 2011 a dezembro de 2014) tratava o suborno exigido das empresas nos grandes contratos de obras, de acordo com delação premiada das empreiteiras. Cálculos do Ministério Público Federal demonstram que o esquema comandado pelo ex-governador procovou um rombo em projetos executados pela Carioca Engenharia e pela Andrade Gutierrez. De acordo com as delações das duas empresas, 7% do valor total foi convertido em propina e dividido da seguinte forma: 5% para Cabral, 1% para Braga e 1% para conselheiros do Tribunal de Contas do Rio (TCE), responsável pela fiscalização dos contratos. O pagamento de propina era efetuado em espécie. Cada emptreiteira tinha um responsável pelo pagamento e cada beneficiado, o seu cobrador.

As investigações coletaram provas de que o dinheiro pago ilegalmente foi, em parte, lavado por empresas criadas pelos próprios favorecidos, usando nomes de amigos e parentes. Outro provável destino foi o cofre de uma transportadora de valores, novo método de camuflar dinheiro de origem ilegal. O esquema bancou, segundo a apuração, uma vida de luxo para os envolvidos que inclui viagens internacionais, idas a restaurantes sofisticados, compras de joias e uso de lancha e helicóptero em nome de laranjas.

O economista Carlos Emanuel de Carvalho Miranda, o Carlinhos, ex-marido de uma prima de Cabral, , e, eventualmente, Luiz Cláudio Bezerra, outro integrante do círculo íntimo do ex-governador, são acusados de atuar como operadores do peemedebista. Toda a negociação entre as empreiteiras e as autoridades era mediada pelo ex-secretário de governo de Cabral, Wilson Carlos, a quem cabia a distribuição da propina, segundo as próprias empreiteiras. Os investigadores suspeitam que parte deste dinheiro era distribuído para deputados estaduais, federais e outros agentes políticos que serão alvos da próxima etapa da investigação.

Sérgio Cabral e sua mulher Adriana Ancelmo durante jantar no restaurante "Luís XV" do Hotel de France, em Mônaco, em 2009 - Reprodução

Outras delações em negociação como por exemplo a do ex-diretor da OAS no Rio, Reginaldo Assunção, deverão reforçar os indícios de corrupção do esquema. Também negocia colaboração Fernando Cavendish, ex dono da Delta Construções, cuja revelação da amizade marca o início do declínio de Cabral. Como revelou O GLOBO, Cavendish presenteou a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo durante uma viagem a Mônaco com um anel avaliado em R$ 800 mil.

As primeira delações sobre o braço da Lava-Jato no Rio foram feitas por Clóvis Primo e Rogério Numa, executivos da Andrade Gutierrez feitas no âmbito do inquérito do caso Eletronuclear. Os dois revelaram ao MPF e à Polícia Federal (PF) que os executivos das empreiteiras se reuniram no Palácio Guanabara, sede do governo, para tratar da propina e que houve cobrança nos contratos de grandes obras. O mesmo esquema foi confirmado pelos acionistas da Carioca Engenharia, Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior em delação ainda não compartilhada pelo MPF do Rio. Agora, em depoimento revelado pelo O GLOBO, Alberto Quintaes, diretor responsável pelo pagamento da propina da Andrade, confirmou que entregava em dinheiro vivo o pagamento ao operador de Cabral, Carlinhos Miranda. O mesmo esquema foi confirmado por outros funcionários da Andrade Gutierrez, Rodolfo Mantuano e Tânia Fontenele.

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