"Diplomacia do vale-tudo", artigo de Aloysio Nunes Ferreira


FOLHA DE S.PAULO


Causou espanto o desatino do diplomata Milton Rondó Filho, chefe da Coordenação-Geral de Cooperação Humanitária e Combate à Fome do Itamaraty, ao enviar instruções inidôneas e panfletárias à rede de embaixadas do Brasil no exterior.

Sem qualquer consulta prévia às áreas competentes do Itamaraty, estreou em tarefa que exorbita em muito a competência de quem, como ele, se dedica, há anos, a tarefas de facilitação logística, pomposamente denominadas de "combate à fome".

O episódio é sintomático de um problema mais grave. Ao agredir as instituições da República em discursos, a presidente Dilma Rousseff gera facciosismo e incita comportamentos descontrolados entre militantes do PT que ocupam cargos públicos.

Em meio à crise, o PT não hesita em fazer uso da máquina pública para desinformar governos estrangeiros e organizações internacionais sobre a realidade brasileira.

O PT fez da afronta à soberania nacional o eixo de sua política externa do vale-tudo. Por um lado, jamais reage contra agressões ao Brasil de aliados ideológicos; por outro, mobiliza assessores palacianos para provocar ingerência externa em assuntos brasileiros. Não são nada mais do que isso as vazias declarações arrancadas por esses assessores de estrangeiros que repetem as teses petistas sobre o impeachment e a Lava Jato.

O Planalto não deu um pio quando a tríade de tiranetes Evo Morales, Rafael Correa e Nicolás Maduro fez declarações ofensivas ao povo brasileiro e às instituições de nossa República.

A presidente tem todo o direito de se defender contra o impeachment, mas deve fazê-lo na forma da lei. Dilma encarna no exterior não só o Executivo, mas também o Legislativo e o Judiciário. Ela não pode aceitar passivamente que autoridades de potências estrangeiras se intrometam em assuntos internos. Não é admissível que chefes de governo estrangeiros desqualifiquem processos constitucionais sem que o governo reaja.

Quando afirmou que as investigações da Lava Jato seriam um "novo Plano Condor", o presidente do Equador, Rafael Correa, ofendeu a memória dos que sofreram nos porões das ditaduras. Isso já seria motivo suficiente para um protesto oficial. Mas não é só. Ele também desqualificou (sob aplausos do PT) o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal.

Os danos causados pelo uso partidário da máquina pública não serão facilmente revertidos. É péssimo a presidente da República falar em risco institucional. Os investidores consideram o Brasil um país com justiça e instituições confiáveis.

Dilma quer convencer diplomatas estrangeiros em Brasília do contrário. Constrangeu-os a servir de claque a um comício lulopetista no Planalto. Lá tiveram que ouvir impropérios da presidente contra o Judiciário e o Legislativo e foram instados a juntar-se a gritos de "não vai ter golpe".

Assessores do PT telefonam freneticamente para o exterior fazendo-se passar pelo que não são: representantes do governo brasileiro. Essa prática de usurpação dos canais oficiais da diplomacia merece ser combatida com veemência, e o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, deve explicações à Comissão de Relações Exteriores do Senado.


*ALOYSIO NUNES FERREIRA, 70, é senador (PSDB-SP) e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado

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