"Meus palpites para 2016: segundo turno terá Haddad e tucano", artigo de Leão Serva


Folha de S.Paulo


Acertei meu primeiro palpite sobre a eleição para a Prefeitura de São Paulo. Agora estou me achando e vou disparar outros. Anote aí e no início de novembro você pode me cobrar...

Cinco meses atrás, participei de um debate organizado por estudantes de jornalismo da ECA-USP no belo auditório da Biblioteca Mindlin. Fiz uma aposta com a plateia, que poderia me cobrar um ano depois: José Luiz Datena não sairia candidato à Prefeitura de São Paulo. E provavelmente, os candidatos mais fortes da campanha seriam o prefeito Fernando Haddad e o vereador Andrea Matarazzo.

No início de dezembro passado entrevistei Datena e seus filhos jornalistas a convite da revista "Top Magazine" (edição de janeiro) e, ao final do encontro, saí convencido de que o apresentador não se candidataria, como escrevi. Por isso, estranhei nos últimos dias do ano quando li notícia de que Datena tinha estado com Silvio Santos e o dono do SBT o convencera a se candidatar. Concluí que era só desejo de fim de ano.

Quando começou 2016, Datena anunciou formalmente que não será candidato. Pronto, não precisamos esperar até agosto. Sempre tive certeza disso, mas como um monte de gente acreditou no que sempre me pareceu um engano, penso que convém alertar o eleitor de outras certezas que desafinam o coro dos analistas de imprensa. Estou me achando: darei agora meus palpites sobre a eleição.

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Antes, explico Datena: o apresentador do "Brasil Urgente" é um jornalista esportivo, alegre e divertido, que adorava o que fazia até perder o emprego em um corte do departamento de esportes da TV Record ainda nos anos 1990. Ofereceram a chance de se tornar apresentador de um programa ao vivo ("Cidade Alerta"), cheio de notícias policiais. Para não ficar desempregado ele topou e o sucesso explodiu. Hoje está na Bandeirantes, onde frequentemente disputa a liderança do Ibope com a Globo. Mas Datena trabalha demais, vive estressado e não se reconhece na imagem que a sociedade tem dele: quanto mais sobe a audiência de sua cara de mau, mais ele trabalha e mais se frustra com o sucesso da ânima. Quando anunciou a candidatura a prefeito pelo PP de Paulo Maluf, imediatamente vi naquilo uma fuga. Pensei: "Datena está procurando uma saída heroica para deixar o estresse de quase 300 programas policiais por ano"... Mas também imaginei que antes da coisa virar séria, ele perceberia a roubada: perderia o salário de apresentador de tevê; e cairia em alguma armadilha do cacique Paulo Maluf, para impedir que o partido se torne oposição ao prefeito Haddad. Pensei que Datena recuaria antes da convenção. Bingo, acertei.

Além de Datena, sobre os demais candidatos:

1. Haddad tem lugar certo no segundo turno e é o mais forte candidato a vencer a eleição.
Em regime de reeleição, o jogo muda completamente, como se o mandato executivo passasse a ter oito anos, com direito a "recall" após quatro. Ou seja: precisa ser um administrador muito ruim para ser demitido no meio de um governo que, de fato, tem oito anos. Muitos analistas e eleitores brasileiros não entenderam isso e tratam as disputas em que há candidatos a reeleição como as outras. Não são. Mesmo mal avaliado, o mandatário tende a vencer o processo porque todos os que votaram nele tendem a confirmar o voto para completar o prometido.

Além disso, as pesquisas que mostram Haddad com cerca de 12 pontos de intenções de voto estão sendo mal analisadas quando afirmam que essa é uma posição ruim. Esse número é excelente, um empate técnico com Marta Suplicy e Datena. Por sua história, Marta deveria estar maior e o índice atual é frustrante; Datena, todos os dias, fala diretamente com o povo. E os três estão atrás de um "candidato bolha", Celso Russomanno, que tende a esfarelar com dez a quinze dias de campanha na televisão (se chegar forte até lá).

Com 12 pontos, a posição de Haddad é a melhor entre todos os candidatos anunciados. Afinal, ele passou três anos de mandato sob críticas intensas, por problemas (a maior parte, diga-se, ele mesmo criou ou maximizou) e qualidades (sua administração mudou o paradigma da discussão sobre mobilidade, tema fundamental da agenda paulistana).

Aposto que Haddad vai crescer um pouco até o início da campanha. E, quando começar o horário eleitoral na TV, atingirá entre 20 e 25 pontos e conquistará o espaço garantido para o candidato do PT no segundo turno de todas as eleições paulistanas desde 1992, esperando a definição do adversário.

2) Andréa Matarazzo deve ser o outro nome no segundo turno.
Muitos analistas políticos argutos dizem que a segunda rodada da eleição será disputada entre um petista e um tucano. São Paulo vive um regime de bipartidarismo de fato desde a redemocratização, nele o PT ocupa sempre o espaço à esquerda, enquanto mudam as legendas antagonistas; mais recentemente o PSDB tem dominado esse outro lado (Kassab era um candidato do tucanato em 2008).

A prévia tucana é uma caixinha de surpresas. Mas tudo leva a crer que Matarazzo vença com apoio de Fernando Henrique, Serra, os Covas (Bruno e Mario) e José Aníbal, entre outros. Ao contrário das aparências, Geraldo Alckmin não deve participar ativamente da disputa, frustrando a expectativa de João Dória. Possível candidato a presidente em 2018, o governador não ganha nada aumentando arestas no tiroteio de uma prévia paulistana (cuja vitória não acrescenta nada no xadrez nacional).

Então, se o mais provável ocorrer, Matarazzo irá para o segundo turno em um movimento que então parecerá natural (o candidato tucano vai ao segundo turno), embora surpreenda quem olhou fixamente para os 4% do candidato no último Datafolha.

3) No segundo turno entre Haddad e Matarazzo, deve dar margem de erro.
Vou apelar para o intervalo de confiança de meus palpites para dizer que Haddad deve chegar à frente com vantagem apertadíssima, "dentro da margem erro", podendo ficar em segundo com a mesma diferença.

4) Marta tende ao terceiro lugar; só vai ao segundo turno se Dória for candidato.
Com histórico de ex-prefeita, senadora, fundadora do PT e invariavelmente citada como "forte na periferia", a candidata do PMDB deveria estar maior nas pesquisas mas amarga um frustrante empate técnico com Fernando Haddad no Datafolha de novembro. Creio que, em uma nova pesquisa, o prefeito já tenha subido além da margem de erro.

Marta deve encolher até a campanha eleitoral porque a tal da força na periferia em verdade é do PT; e o PMDB, embora grande no Brasil é um partido nanico em São Paulo. Quando quiser ir a Sapopemba, Capão Redondo, Cidade Dutra ou Tiradentes, a ex-prefeita não terá associações de bairro para anunciar sua visita, não encontrará vereadores para recebê-la nem diretórios para preparar o churrasco. Será uma campanha solitária com mais adesões na Oscar Freire do que em Grajaú.

5) Marta só vai surpreender se o candidato tucano for João Dória.
Exatamente a relação mais profunda de Marta com os ricos moradores dos Jardins é que pode ser o seu efeito surpresa: ela pode ser beneficiada por um voto tucano tradicional, socialdemocrata, caso João Dória seja o candidato do PSDB. Pense nos esquerdistas que fundaram o partido, como Fernando Henrique, José Serra e Mario Covas, companheiros de Marta nos anos de ditadura, que a apoiaram em 2000. Seus eleitores não se identificam com o perfil "coxinha" que João Dória representa (por problema de imagem, não precisa ser verdade verdadeira). Pergunte ao eleitor de Serra em quem ele vai votar se os três primeiros colocados forem Haddad, Russomanno e Marta...

6) Celso Russomanno não será nem terceiro colocado.
Em minha bola de cristal, o candidato da Igreja Universal aparece como uma bolha que deve murchar tão logo comecem a ser disparados os típicos dardos de campanha. Nem crente o candidato é. E talvez nem mesmo queira ser candidato. Só isso explica que ele tenha contratado novamente funcionários públicos, com verba de seu gabinete, para trabalhar em empreendimentos privados. Irregularidades como essa, que afrontam o eleitor, já tinham sido apontadas contra sua candidatura em 2012. Repetir o erro mostra que ele não entende o que é o escrutínio da imprensa sobre uma candidatura (e se não aprendeu, não tem como se firmar). Além desse problema, ele terá que explicar parcerias com pessoas acusadas em escândalos federais. E Russomanno tem mania de se explicar demais, amplificando problemas.

Bem, esses são meus palpites. Agora vou guardar minha bola de cristal e meu analista político na caixinha de surpresas, que só vou reabrir em novembro. Até lá.




*Leão Serva é ex-secretário de Redação da Folha, é jornalista, escritor e coautor de 'Como Viver em SP sem Carro'.

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